O problema da Amazônia vai muito além da questão das queimadas, que em agosto/setembro do ano em curso, sobretudo por razões climáticas, chegou a promover comoção mundial e o desencadeamento de uma crise entre governos e ambientalistas. Tentou-se imprensar o presidente Jair Bolsonaro contra o G7 e a comunidade mundial, levando a crer que, em oito meses, seu governo houvera recrudescido de modo praticamente irreversível o processo de destruição da floresta amazônica. Na verdade, o que está em jogo (ou deveria estar) é a necessidade de criação de políticas públicas de Estado voltadas ao estabelecimento de bases sólidas de longo prazo para a sedimentação do desenvolvimento. Não é demais repetir: só a efetiva ocupação econômica dos espaços geopolíticos vazios haverá de garantir a preservação sustentável do bioma.
Com efeito, o uso racional da biodiversidade – base do processo -, de acordo com o cientista Ozorio Fonseca, na obra de sua autoria “Pensando a Amazônia”, 2011, “só começou a receber real atenção no Brasil, depois da Rio-92, quando foram configurados os elementos essenciais do paradigma do desenvolvimento sustentável assim entendido como utopia possível”. Graças ao evento, salienta Fonseca, “as discussões em torno do tema evoluíram dos limites de movimentos grupais para as academias”. No governo Collor de Mello (1990-1993), “foram inseridas na esfera do poder público, onde a tríade ‘utopia-projeto-agenda’ passou a constituir a base de sustentação do desenvolvimento harmônico”.
O governo Itamar Franco (1992-1995), na qualidade de centro de convergência do debate sobre questões amazônicas, delegou as atribuições ao Conselho Nacional da Amazônia Legal (Conamaz), criado em 1993 e regulamentado em 1995. Sua estruturação viabilizou ao primeiro governo Fernando Henrique Cardoso (1995-1998) lançar a “Política Nacional Integrada para a Amazônia Legal” (Conamaz, 1995). Dentre os objetivos mais relevantes do projeto, ainda segundo Ozorio Fonseca, destacam-se “a reorientação do crescimento econômico”, “a integração interna e externa” e a “valorização humana e social”. A Conamaz permitiu a elaboração da Agenda Amazônia 21, configurada de acordo com os princípios e fundamentos da “Agenda 21 Global” aprovada na Rio-92.
No contexto da “Agenda Amazônia 21” resultou a criação da (até hoje improdutiva) Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) e o estabelecimento de prioridades científicas ao abrigo da Comissão Coordenadora Regional de Pesquisas da Amazônia (Corpam) criada em 1989, como órgão assessor da Secretaria Especial de Ciência e Tecnologia da Presidência da República (SCT-PR), para definição das diretrizes, alocação de recursos e acompanhamento da execução do Programa do Trópico Úmido (PTU). Objetivo: propiciar maior articulação entre as instituições de pesquisa da região visando a identificação de oportunidades de cooperação para execução de programas prioritários estruturados na biodiversidade e energias alternativas.
O caminho da biodiversidade, base da bioeconomia, com efeito, vem sendo pavimentado há mais de 50 anos aqui mesmo na região por notáveis estudiosos da Amazônia, e da economia da Zona Franca de Manaus. Dentre os quais, destaco: Arthur Reis, Djalma Batista, Samuel Benchimol, Ozorio Fonseca, Bertha Becker, Cosme Ferreira Filho, Jefferson Péres, Admilton Salazar, Antonio Iran Gadelha, Guajarino de Araujo Filho. Se, de um lado, ações planejadas desde a Rio 92, passando pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentado (ODS) – Agenda 2030, da ONU, não avançam (Conamaz, Corpam, OTCA, PTU perderam-se pelo caminho ), novos planos de desenvolvimento são elaborados, mesmo havendo em estoque outros projetos na mesma direção, mas que não decolaram. Exemplo:Construção do Plano Estratégico de Desenvolvimento do Amazonas 2030, de 2014, elaborado internamente (a custo de fatores) pela mesma Seplan. Como não saem do papel, faça-se novos. Que logo passarão a mofar nos arquivos mortos dos porões governamentais.(Osíris Silva é Economista, Consultor de Empresas, Escritor e Poeta – osí[email protected])