MANAUS VIU e APLAUDIU PELÉ – Por Nicolau Libório

Dr. Nicolau Libório(AM)

Pelé pisou em solo amazonense pela primeira vez numa quinta-feira ensolarada, no dia 8 de agosto de 1968. O avião da Varig aterrissou no aeroporto de Ponta Pelada, bairro Colônia Oliveira Machado(hoje aeroporto militar), por volta das 15 horas e alguns minutos, procedente de Belém. O primeiro a desembarcar foi o empresário Francisco Meireles, responsável pela vinda do time praiano para duas apresentações. A delegação trazia, além do rei, outros grandes nomes como Gilmar dos Santos Neves, o ponta esquerda Pepe, ambos bicampeões mundiais, o grande zagueiro Ramos Delgado, Lima, Clodoaldo, grande promessa para a Copa de 1970. Mas o meu interesse maior como repórter, na época, da Rádio Rio Mar era entrevistar Pelé.

O desembarque foi iniciado pela porta dianteira, para onde todos os profissionais da crônica se dirigiram. Observei que o ônibus que conduziria a comitiva estava estacionado um pouco distante, na parte interna, quase na pista de pouso. Fiquei desconfiado e resolvi arriscar, deslocando-me na direção do veículo. Apressei os passos ao mesmo tempo em que percebia que uma segunda escada era colocada diante da porta traseira da aeronave e, de repente, Pelé descia e entrava no automóvel do presidente da FAF, Flaviano Limongi, para ser conduzido direto ao ônibus e escapar do enorme assédio dos torcedores. Cheguei na hora certa. Antes que o motorista acelerasse o veículo para recolher o restante da delegação, lá estava eu diante do grande ídolo. Pelé surpreendeu-me pela simplicidade. Atendeu-me de forma atenciosa, respondendo pacientemente a todas as perguntas formuladas. Naquele momento percebi que Pelé não era apenas o “deus” de todos os estádios. Era e sempre foi um perfeito cidadão, um ser humano. Naquele instante ele ajudava um jovem repórter a marcar um verdadeiro gol de placa. Não é demais dizer que fui um privilegiado.

A pacata Manaus com sua população de 260 mil pessoas, tinha no comando da prefeitura o professor de direito penal, Paulo Pinto Nery, e

começava experimentar os benefícios do Decreto 288 de fevereiro de 1967, que deu origem a Zona Franca e a certeza de uma fase positiva com o polo industrial. A cidade, que viveu a riqueza na época da borracha, que chegou a ser chamada de Paris dos Trópicos, mas que sentiu o amargo sabor da decadência, começava acreditar que ventos de prosperidade estavam chegando, trazendo um novo ciclo de desenvolvimento econômico.

Pelé e o Santos de glórias mil davam motivos para a euforia do torcedor amazonense. Os amantes do futebol viviam um clima de festa. Ninguém reclamava dos preços dos ingressos; geral 7 cruzeiros novos; arquibancadas 30 cruzeiros novos. Sorte de quem teve a oportunidade de ter acesso ao estádio da Colina. Até o governador Danilo Areosa, antes nunca visto em locais de eventos esportivos, resolveu marcar presença.

No Dicionário Michelis On-Line consta como adjetivo o apelido de Edson Arantes do Nascimento, mineiro de Três Corações. No verbete, Pelé é alguém fora do comum, excepcional, incomparável, único. Um adjetivo que sempre qualifica os bons profissionais e as pessoas virtuosas.

O Santos, sem nenhuma surpresa, venceu os dois jogos. O primeiro foi contra Nacional Fast Clube, que à época era presidido pelo empresário Ézio Ferreira, na noite do dia 9 de agosto, sexta-feira. O time da Vila Belmiro decidiu oferecer espetáculo e ao mesmo tempo aplicar uma goleada de três a zero. Mas os fastianos nem reclamaram. Pepe, Pelé e Wernek foram os goleadores. Busquei, no meu baú de recordações, antigas anotações que me permitiram lembrar que o Santos jogou com Cláudio, Wilson, Ramos Delgado, Joel Camargo e Turcão; Douglas e Lima; Manoel Maria, Negreiros (Wernek), Pelé e Pepe. O Fast, clube do Boulevard Amazonas, perdeu com Pedro Brasil, Antonio Piola, Luizinho, Zequinha Piola e Pompeu; Nonato e Santana; Alfredo, Amaro, Edson Piola e Bezerra. O árbitro do jogo foi Manoel Ramos, auxiliado por Dorval Medeiros e José Pereira Serra.

No domingo, 11 de agosto, com a presença do governador Danilo Duarte de Matos Areosa, foi a vez do Nacional, clube do desembargador Joaquim Paulino Gomes, que tinha como técnico o saudoso João Bosco Ramos de

Lima. Para quem não sabe ou não lembra, Bosco foi narrador, comentarista, deputado estadual, vice-governador e senador da República. O Santos voltou a vencer, dessa vez por dois a um, com gols de Wernek e Pelé, enquanto Pretinho foi o autor do gol amazonense. O Santos jogou com Gilmar, Wilson, Ramos Delgado, Joel Camargo e Turcão; Clodoaldo e Lima, Manoel Maria, Wernek, Pelé e Pepe.

O Nacional perdeu com Marialvo, Pedro Hamilton, Jonas, Berto e Téo; Mário e Rolinha; Zezé, Lió, Rangel (Holanda) e Pretinho. É bom lembrar que o Nacional chegou a empatar o jogo, na cobrança de falta do zagueiro Berto. Mas o árbitro Manoel Ramos, que por sinal acompanhava a delegação do Santos, entendeu que a cobrança da falta teria sido feita de forma irregular. Os árbitros auxiliares Odílio Mendonça e Luiz Roberto Carneiro ficaram longe da polêmica. E a torcida, que foi ao estádio para ver Pelé, não deu bola para o resultado registrado no placar.

Pelé cumpriu a sua missão na terra com o seu vasto repertório de incríveis jogadas, Não foi apenas substantivo, foi diferente, adjetivo que lembra qualidade. Foi hors concours, sempre foi considerado o melhor dos melhores. Pelé, que nasceu no dia 23 de outubro de 1940, deixou este mundo, para a tristeza de muitos, em 29 de dezembro de 2024.(Nicolau Libório é Procurador de Justiça aposentado, Ex-Delegado de Polícia, Jornalista e Radialista.) – 03.07.25)