COVARDIA – Por Felix Valois

Artigos: Advogado Felix Valois(Am)

O texto da semana passada rendeu vários comentários. A maioria, para minha satisfação, manifestava concordância com o ponto de vista abraçado por este modesto escriba. Outros, nem tanto. Houve um que, por sua singularidade, me chamou particularmente atenção. Um senhor, talvez pensando em deus, pátria e família, disse algo mais ou menos assim: “comparar assaltante de banco e sequestrador com Bolsonaro é coisa de comunista”. Ri-me a bandeiras despregadas, se é que ainda se usa expressão tão antiga. Por isso, respondi singelamente assim: “e é mesmo, com muita honra”.

Depois, bem depois, fiquei a matutar que é bem possível tenha eu cometido um ato falho. Vejamos: os assaltantes e os sequestradores nunca me fizeram mal. Por que, então, haveria eu de ofendê-los, comparando-os com tão abjeta figura? Estou que ninguém merece tamanha injúria. Fica feito, portanto, o conserto, que, por sua vez, me transporta a uma elucubração, cuido que um pouco mais profunda.

Grande parte da direita brasileira tomou-se de amores inexplicáveis por Bolsonaro. Qualificá-lo de “mito”, por exemplo, é caracteristicamente uma prova de fanatismo, que escapa a qualquer análise racional. Note-se que está longe de mim pretender que a direita, como força política, seja toda ela integrada por débeis mentais. Nem pensar. Há pessoas, dentro desse espectro do pensamento político, que são extremante preparadas, com embasamento teórico forjado na leitura e na crítica. A voo de pássaro, vem-me à lembrança o nome do doutor Jorge Pinho, nosso conterrâneo. Pinho é o reacionário mais erudito que conheço nesta terra das amazonas. Estudioso, dedicado, tem uma invejável produção intelectual, que lhe serve como mecanismo de exposição e defesa de ideias. É, pois, um respeitável quadro da direita.

E aí é que a dúvida me assalta. É possível, ainda que no mais abstruso dos sonhos, dizer algo semelhante de Bolsonaro? A resposta negativa parece-me inevitável e incontroversa. Na síntese mais apertada que a linguagem permite, é possível dizer que Bolsonaro é um ignorante. Sua formação cultural, se é que teve alguma, é de uma deficiência a toda prova. Penso, mesmo, que lhe seria difícil estabelecer as diferenças entre coisas tão distintas como um viaduto e um veado adulto. O esforço mental para se desincumbir de uma tarefa dessa ordem, por certo lhe exigiria o desgaste de todas as suas reservas e poderia levá-lo a uma prisão de ventre irreversível.

Por esse fato básico, estão a lhe faltar todas as qualidades que, ao longo da História, ensejaram o surgimento das grandes lideranças políticas. Mesmo Hitler, paranoico e genocida, era possuidor de qualidades inerentes aos que nasceram para estar à frente dos grandes movimentos. Ocorre que, exatamente por sua visão deturpada pelo

sentimento direitista, foi o protagonista de um dos maiores horrores que a humanidade já presenciou. Era um gênio do mal.

Bolsonaro, porém, nem para isso pode servir. Aliás, falar de genialidade em se tratando de um bronco, é tentativa inútil de cortar diamante com faca de cozinha. A crosta de estupidez que reveste a couraça desse energúmeno é impenetrável.

Como, então, consegue ele liderar milhões de brasileiros? Não sei. É, talvez, intrincado fenômeno que só possa ser explicado pela profunda sociologia do doutor Lúcio Carril. Consegue ele reunir a seu redor a choldra mais sórdida da política nacional, com homens e mulheres que não se pejam de desempenhar um papel ridículo contanto que estejam em concordância com seu “mito”.

Os fatos recentes estão aí registrados. Envolve-se um pneu de caminhão com a bandeira nacional e idiotas de todos os matizes se põem entoar o nosso hino. É possível conceber coisa mais ridícula? O pior é que é. Todos viram uns beócios com os respectivos celulares acima da cabeça, a invocar seres extraterrestres que, se tivessem visto o espetáculo, haveriam de concluir que severa epidemia consumira todo o resto de inteligência deste planeta.

Esse é o quadro em que Bolsonaro vai desempenhando seu triste papel. Ele, que dos outros zombou na pandemia, invocando sua “formação de atleta”, alega estar acometido de graves doenças circulatórias e pulmonares. A resistência do atleta se esvaiu diante da dura realidade. No final das contas, acho mesmo que todo esse quadro clínico difundido tem uma origem muito clara: medo do cárcere. Um alvará de soltura lhe devolveria saúde plena. Mas isso também tem um outro nome muito mais objetivo: covardia.(Felix Valois é Advogado, Professor, Escritor e Poeta – [email protected]) – 11.10.25