Águas contaminadas no RS devem causar doenças com risco de morte e surto de dengue, diz infectologista

Pessoas expostas podem contrair leptospirose, hepatite A, gastroenterite viral e bacteriana, além de parasitoses intestinais. Chuvas no estado já deixaram mais de 90 mortos e 132 desaparecidos, segundo a Defesa Civil…

As chuvas que atingem o Rio Grande do Sul há uma semana devem resultar em uma série de doenças, segundo a infectologista Stephanie Scalco. No contato humano, a água misturada com a urina de ratos pode causar leptospirose que, em casos graves, pode matar. Já a água represada tende a gerar surtos de dengue. Até esta segunda-feira (6), o os temporais no estado já causaram 90 mortes.

As águas que inundam as cidades são perigosas pois se juntam ao esgoto, de acordo com a infectologista, que é gestora médica do Serviço de Controle de Infecção do Hospital Ernesto Dornelles, em Porto Alegre. As doenças que podem ser contraídas a partir desse contato são hepatite A, gastroenterite viral, gastroenterite bacteriana, leptospirose e parasitoses intestinais.

“A água tem excrementos humanos, tem resíduos de fezes humanas e não humanas. Então, tudo que pode ser transmitido por meio de esgoto vai estar presente nessa água”, afirma.
A especialista afirma que a chance de contrair uma doença na água está associada a uma série de fatores, como o contato prolongado, ferimentos abertos, ingestão acidental e contato com a boca ou nariz.

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A manifestação dos sintomas varia de acordo com a doença, mas pode surgir rapidamente após a ingestão da água, segundo a médica. Ela reforça que os sintomas mais comuns são diarreia, vômito e mal-estar após ingestão. Eles podem se manifestar depois de 24 horas de exposição.

A leptospirose, por outro lado, pode ter um período de incubação que varia entre 3 até 20 dias de incubação, resultando em morte, em casos mais graves.

“Sempre tem risco de morte essas doenças. Vai depender muito da fragilidade da pessoa que contraiu, então quanto mais doente, mais frágil, [pior]. Idosos, crianças apresentam mais risco de mortalidade, a gente tem aí um percentual considerável de casos de leptospirose que evoluem para forma grave”, afirma.

“Sempre tem risco de morte essas doenças. Vai depender muito da fragilidade da pessoa que contraiu, então quanto mais doente, mais frágil, [pior]. Idosos, crianças apresentam mais risco de mortalidade, a gente tem aí um percentual considerável de casos de leptospirose que evoluem para forma grave”, afirma.

Como se prevenir?

Para a especialista, a melhor forma de se prevenir contra as doenças é evitar o contato com as águas das enchentes, mas, caso seja impossível, existe uma série de cuidados que podem ser tomados. Entre eles:

Não entrar em contato com a água em caso de ferimentos abertos (caso não seja possível, tapar o local)
Não ficar submerso na água por mais de 15 minutos
Usar roupas que cubram todas as partes da pele (calças, botas, luvas)
Não ingerir a água
Se a única água disponível para consumo for a da enchente, fervê-la antes

Uso de antibiótico

A Sociedade Brasileira de Infectologia lançou uma nota conjunta neste domingo (5) recomendando o uso de doxiciclina ou azitromicina para dois grupos expostos às águas da enchente:

Equipes de socorro e voluntários com exposição à água por tempo prolongado sem equipamentos de proteção individual

Pessoas expostas à enchente por longo período, a partir de avaliação médica criteriosa do risco da exposição
Embora não seja uma ação recomendada rotineiramente, a entidade afirma que, em situações de alto risco, a intervenção pode ser considerada, mesmo não sendo 100% eficaz. O documento é assinado também pela Sociedade Gaúcha de Infectologia e pela Secretaria Estadual de Saúde (SES). A orientação não inclui gestantes e mulheres que amamentam.

Casos de dengue

A infectologista Stephanie Scalco alerta que, em razão das enchentes, que deixam água parada, os casos de dengue devem aumentar no estado, em razão da proliferação do mosquito. Na última nota divulgada pela SES, a doença havia causado a morte de 126 pessoas em 2024 no estado.

“Será um desafio para as outras equipes de saúde fazer diagnóstico diante de tantas doenças possíveis. Então, síndrome febril vai entrar no diagnóstico, [podendo ser] dengue, leptospirose, hepatite. Tudo isso vai ser um desafio muito grande para o pós-catástrofe. É uma preocupação das autoridades de saúde também”, diz.

Temporais no RS

As chuvas que atingem o Rio Grande do Sul desde 29 de abril são o maior desastre climático da história do estado, superando uma grande cheia que ocorreu nos anos 40. O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) estima que foram registrados nos últimos dias quase 700 milímetros em alguns pontos do estado.

Segundo a Defesa Civil, há 90 mortos e 132 desaparecidos. Outros quatro óbitos estavam sob investigação. 388 dos 497 municípios do estado registraram algum transtorno, afetando 1,3 milhão de pessoas. 203,8 mil pessoas estão fora de casa – 48,1 mil em abrigos e 155,7 mil desalojadas (nas casas de familiares ou amigos).

Desde o domingo a chuva deu trégua na região, mas as enchentes ainda se mantêm – e devem levar até quatro dias para baixar. Há ainda previsão de mais chuvas na região para a partir da metade desta semana, o que pode piorar a situação em áreas já castigadas pelos temporais.

Na capital, as águas do lago Guaíba se mantêm em cerca de 5,30 metros e as principais rotas de acesso e saída estão bloqueadas. Além disso, o aeroporto Salgado Filho está fechado por tempo indeterminado, assim como a Rodoviária de Porto Alegre.

Além das mudanças climáticos, os temporais são consequências de, pelo menos, três fenômenos, de acordo com os meteorologistas: correntes intensas de vento, um corredor de umidade vindo da Amazônia, aumentando a força da chuva, e um bloqueio atmosférico, devido às ondas de calor.(g1)