Bang-Bang – Por Nicolau Libório

PJ Nicolau Libório(Am)

No ataque, com seus dribles eficientes, o baiano Lió era a certeza de gols e de grandes vitórias. Na quarta-zaga, o grandalhão Berto, exímio batedor de faltas, assustava os atacantes adversários, por ocasião das jogadas divididas, em razão do seu avantajado porte físico. Os dois ajudaram o Nacional Futebol Clube a conquistar o título de 1968 e, por isso, eram idolatrados pela torcida. Mas de repente o louro Lió e o zagueirão Berto, por um banal desentendimento, conseguiram ganhar espaços generosos nas páginas policiais e, apesar do apelo de grande parte da torcida nacionalina, foram banidos do futebol amazonense.

O time da Tuna Luso veio a Manaus no início de 1968 para alguns jogos amistosos, trazendo um ataque arrasador: Manoel Maria, Laércio, Lió e Milton. A Tuna retornou a Belém com o time praticamente desmontado, porque Manoel Maria foi contratado pelo Santos de Pelé, Laércio ficou no Fast, Milton no Rio Negro e Lió gostou tanto de Manaus e das amazonenses que não hesitou em aceitar a proposta do Nacional que começava a montar um elenco com objetivos ousados. Lió chegou até a rejeitar proposta do Clube do Remo, optando por se integrar ao grande projeto do presidente do Naça, desembargador Joaquim Paulino Gomes. Ao lado de Pepeta, era um dos preferidos do público feminino, aumentando a sua popularidade à medida que a sua coleção de gols abria caminho para os consagradores triunfos.

Estimulados por razões nunca esclarecidas, alguns jogadores do Nacional, decidiram andar armados. E exibiam os revólveres com a maior naturalidade como se arma de fogo fosse brinquedo, sem qualquer preocupação com os riscos. E foi por pura inconseqüência que Lió e Berto, para o desespero dos companheiros, decidiram duelar. A ideia infeliz teve consequências nefastas.

Três dias depois do carnaval de 1969, o técnico Alfredo Barbosa Filho comandava um treinamento coletivo para o time, no campo da vila Municipal (hoje Adrianópolis), visando o início da temporada, com dois jogos amistosos em Parintins. Lió atuava entre os reservas, Berto na defesa da equipe titular. Os dois começaram a trocar insultos, palavras ásperas que evoluíram para disputas de bola com violência, mas os companheiros acreditavam que o bate-boca terminaria ali mesmo. Afinal de contas a fase de vitórias da equipe não oferecia nenhum motivo para desentendimentos.

Final de treino, Lió saiu a caminho do improvisado vestiário, quando foi interpelado por Berto, que desejava resolver o problema à bala, queria duelar. O pior é que Lió topou a parada e o caldo derramou. Os dois, em suas motocicletas, seguidos por alguns colegas, rumaram para a estrada Manaus-Itacoatiara. Berto, bem ao estilo Django, sacou primeiro e disparou contra o antagonista. Lió, prevenido, também atirou, errou o alvo, mas foi atingido na barriga por um balaço, sendo socorrido pelos laterais Mário Jorge e Chiquinho, e pelo zagueiro Sula, que o levaram para o pronto socorro do Hospital Getúlio Vargas.

Ao saber do episódio, o presidente Joaquim Paulino Gomes, que se dirigia ao local do embarque da delegação para Parintins, não vacilou. Por detestar cenas de bang-bang, determinou a dispensa dos dois indisciplinados. Lió, que se recuperou rapidamente da lesão, retornou à Bahia e nunca mais conseguiu se destacar, nem mesmo em equipes de menor expressão. Berto, que seis dias após a prática do ilícito penal, apresentou-se à polícia, foi indiciado por tentativa de homicídio. Por haver escapado do flagrante foi liberado pelo delegado para responder o processo em liberdade. Não recordo ter sido ele julgado pelo Tribunal do Júri, mas tenho informações que sua carreira foi encerrada em um clube sem grande projeção de um país vizinho.

O importante é que, mesmo com a repercussão do fato, o ambiente do Nacional não sofreu o menor abalo. O clube vivia em clima de festa com a torcida. Para o lugar de Berto, Valdomiro assumiu a titularidade imediatamente. Quanto a Lió, que alternava com Pretinho no comando do ataque, foi esquecido em pouco tempo. Pretinho, com suas cabeçadas certeiras e seus chutes violentos, segurou por um bom tempo a condição de titular. E o Nacional foi novamente campeão em 1969, ganhando, inclusive um amistoso contra o Grêmio Esportivo Maringá, no Maracanã, façanha que encheu de orgulho a sua fanática torcida. Naquele tempo os torcedores sabiam a escalação do Nacional de cor e salteado: Marialvo, Pedro Hamilton, Sula, Berto ou Valdomiro e Téo; Mário Motorzinho e Rolinha; Zezé, Rangel, Lió ou Pretinho e Pepeta.(Nicolau Libório é Procurador de Justiça, Jornalista e Radialista – [email protected])

NR – Coluna publicada excepcionalmente  hoje.