O mundo enfrenta problemas da maior gravidade. No setor ambientalista, o aquecimento global é tema que preocupa quantos se debruçam sobre o assunto. Vinculada a isso, temos a questão do devastamento e das queimadas que, atingindo principalmente a floresta amazônica, nos diz respeito de forma direta. Se nos deslocarmos para uma visão sócio-política, torna-se impossível negar que a guerra russo-ucraniana é motivo de preocupação universal, na medida em que suas consequências não se restringem à área em conflito. Muito pelo contrário, sempre diz respeito da toda a humanidade o sacrifício inútil e injustificado de milhares de vidas.
Pois muito que bem. Nesse cenário não muito luminoso, a exigir a atenção de todos os homens e mulheres responsáveis, eis senão quando a Câmara Municipal desta mui nobre e altiva cidade de Manaus decide dar o seu contributo para o enfrentamento das dificuldades. Bem por isso, a augusta Casa legislativa vem de aprovar projeto que cria o “Dia do Conservadorismo”.
Estamos salvos. Com tão brilhante iniciativa, estão afastados e superados problemas menores como o da ameaça nuclear, os buracos na camada de ozônio, o degelo dos polos. Homenageando o conservadorismo (seja lá o que isso signifique), por certo que damos um passo gigantesco para ficarmos na vanguarda de todos os movimentos que lutam por um universo melhor e por uma sociedade mais justa, com equânimes distribuições de oportunidades e de renda.
Em outra oportunidade, reconheci as dificuldades que enfrentam os legisladores estaduais e municipais para cumprirem suas funções. A fixação das competências legislativas feita pelo Constituição Federal concentra quase tudo na esfera da União, deixando pouca margem a estados e municípios. Como sei que deputados estaduais e vereadores também têm que prestar contas ao seu eleitorado, até dá, com um pouco de boa vontade, para entender que eles se esforcem para produzir qualquer coisa que justifique suas remunerações. Daí, porém, ao ridículo vai uma distância abissal.
Convenhamos. Acho que atualmente não existe nenhuma profissão ou atividade que não tenho o seu “dia” no calendário oficial das três esferas federativas. Alguns desses “dias” até justificados, outros, completamente desvinculados de qualquer realidade, não passam de exercício onírico dos autores das respectivas proposições.
Vejamos o que se pode deduzir dessa última proeza da Câmara de Manaus. No verbete “conservadorismo”, o dicionário Houaiss oferece a seguinte definição: “qualquer ideologia fundada na tradição e geralmente contrária a inovações
políticas e/ou sociais”. Diz ainda que por “conservadorismo” é possível entender a “ideologia original de apego às raízes históricas de uma sociedade e às tradições e instituições herdadas, nos moldes preconizados pelo estadista irlandês Edmund Burke”.
Pergunto, então, eu, aqui recolhido à minha total e completa insignificância: o que, diabos, a Câmara quer homenagear com a aprovação de tal projeto? Se alguém é contra o progresso e fica ruminando o passado, é um problema pessoal que, no máximo, vai permitir que essa pessoa seja rmaileconhecida como reacionária irrecuperável. Mas prestar homenagem à ideia em si mesma, é uma forçação de barra incompreensível.
Termino, não sem antes apresentar algumas sugestões: o dia do sádico e o dia do masoquista seriam uma boa ideia. Indispensável mesmo parece-me criar o dia do idiota. Francamente.(Felix Valois é Advogado, Professor, Escritor e Poeta – [email protected])