Declaração dos Direitos Humanos da ONU e os direitos sociais – Por Osíris Silva

A Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) completa, nesta data, 10 de dezembro de 2018, 70 anos de vigência, criada que foi em 1948 em resultado das tratativas diplomáticos dos Aliados (à frente Estados Unidos, Inglaterra e Rússia) empreendidas com vistas aos acordos de paz resultantes das rendições de Alemanha, em 8 de maio de 1945, e do Japão, ocorrida meses depois, no dia 2 de setembro de 1945, quando o país enfim assinou o ato de capitulação.

A data tornou-se conhecida como Vitória sobre o Japão, ou Dia V-J, e marcou o fim da Segunda Guerra e o início de um longo processo de recuperação econômica do combalido Japão. Os nipônicos relutaram muito em aceitar a derrota, só o fazendo após duríssimos massacres infringidos ao país, incluindo as duas bombas atômicas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki, e por último a ocupação de Tóquio encabeçada pelos Estados Unidos, Austrália, Índia, Nova Zelândia e Reino Unido.

O Declaração dos Direitos da ONU, verdadeiro hino à paz, tomou como modelo a Declaração da Independência dos Estados Unidos da América, de 4 de julho de 1776 – um dos mais belos manifestos em favor da condição humana -, que, em seu Art.1º, dispõe:: “Consideramos estas verdades por si mesmo evidentes, que todos os homens são criados iguais, sendo-lhes conferidos pelo seu Criador certos direitos inalienáveis, entre os quais se contam a Vida, a Liberdade e a busca da Felicidade”.

A Declaração da ONU

Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) proclama:
“A presente Declaração Universal dos Diretos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.

Dispõem seus três primeiros artigos:

Artigo I
Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.

Artigo II
Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.

Artigo III
Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”.

Direitos Sociais

A questão dos “direitos sociais”, por conseguinte, constitui o âmago da luta do homem em busca de condições dignas de vida, para si, sua família e a comunidade a que pertence. Desde a Pré-história também tem sido a motivação subjacente ao esforço que nossos ancestrais empreendiam no sentido de satisfazer suas necessidades básicas: habitação, alimentos, segurança. Naquela época enfrentavam seus semelhantes, os inimigos naturais, além das intempéries. Tudo com o objetivo de satisfazer as necessidades dos seus dependentes. Afinal, precisava, a qualquer custo, sobreviver.

A partir dessa gênese, tais necessidades e os diferentes métodos de satisfazê-las derivam, num raciocínio simplificado, o conceito de direitos sociais. De acordo com estudos divulgados pela ONU, “constituem, em essência, a forma de garantir, de modo civilizado e legal, aos indivíduos, condições materiais tidas como imprescindíveis para o pleno gozo dos seus direitos”.

No sentido lato, ainda segundo a ONU, os direitos sociais do homem consistem em: o direito à vida (direitos da mãe, direitos da infância, direito das famílias numerosas); direito à igualdade do homem e da mulher; direito a uma educação digna do homem; direito de imigração e de emigração; direito de livre escolha para aderir às diversas associações econômicas, políticas e culturais.

Contemporaneamente, o conceito de direito social tem como origem as profundas mudanças sociais, econômicas e culturais decorrentes da Revolução Industrial deflagrada na Inglaterra, no século XIX, a partir da descoberta do vapor como força dinâmica. O uso de máquinas a vapor na indústria e nos transportes, basicamente, gerou conflitos de intensa e incessante evolução. Na Inglaterra e na Europa, principalmente, os danos foram mais imediatos. Desemprego em massa, motivado pela migração do homem do campo dos feudos para os burgos e depois para as cidades florescentes, foram se agravando.

Com esse fenômeno, formaram-se cinturões urbanos de miséria resultantes do excedente de mão de obra produzida nesse processo. As desigualdades sociais, de forma contundente, foram se agravando, um fenômeno que até então o homem desconhecia na forma da virulência com que passou a se apresentar. O Estado foi instado a agir. Passou a buscar mecanismos para fazer frente, eficazmente, a esse novo cenário de tal sorte a gerar instrumentos de proteção ao trabalho, e, num conceito mais amplo, aos direitos sociais que se foram constituindo explicitamente.

Conceitualmente, os direitos sociais começaram a ser estruturados a partir da fundamentação teórica a respeito do “contrato social” difundida entre os séculos XVI e XVIII. O objetivo: “explicar ou postular a origem legítima dos governos e, portanto, das obrigações políticas dos governados ou súditos, tendo em Thomas Hobbes (1651), John Locke (1689) e Jean-Jacques Rousseau (1762) os mais famosos filósofos do Contratualismo.

Confúcio e a meritocracia

Pessoalmente, entendo que os direitos sociais têm origem ainda mais distante. Precisamente, a partir de Confúcio (551 a.C. – 479 a.C), que exerceu forte influência política e filosófica sobre a China e toda a Ásia oriental. Enfatizava o Confucionismo “a moralidade pessoal e governamental, a exatidão nas relações sociais, a justiça e a sinceridade”. Preconizava, em termos práticos, ”a ascensão do indivíduo na sociedade pelo próprio mérito e não por linhagem sanguínea, como praticado pela nobreza ocidental”.

Tais fundamentos constituíram a base filosófica que impulsionou aquele continente e que, por exemplo, é o fundamento da força econômica, educacional, urbana e tecnológica da China contemporânea. Ainda hoje os gestores públicos chineses são escolhidos segundo o critério da meritocracia, não de indignos privilégios cartoriais derivados do nepotismo, sinônimo da concessão de privilégios ou cargos a parentes no funcionalismo público, largamente praticado no Brasil

Na perspectiva brasileira, “a Constituição Federal (dita cidadã), de 1988, estabelece, no artigo 6º, que “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” – redação dada pela Emenda Constitucional nº 64, de 2010. Evidentemente, o governo federal tem-se mantido incompetente no sentido de prover ao povo a excelência desses serviços.

O Brasil continua um país injusto e fragmentário, no qual o cidadão comum ainda se priva de condições básicas em relação a esses serviços, sobretudo no que tange à saúde pública, educação de qualidade, habitação popular, previdência social, saneamento básico, mobilidade urbana e infraestrutura física portuária, de transporte aeroportuário, rodoviária e ferroviário.

Em termos de condições sociais dignas oferecidas ao cidadão, permanecemos ainda um país em lento processo de construção. Quem sabe um dia essa obra venha a ser concluída.(Osíris Silva é Economista, Consultor Empresarial, Escritor e Poeta – [email protected])

NR – Publicação feita, excepcionalmente.