Força do Apelido – Por Nicolau Libório

Procurador Nicolau Libório(AM)

Quem nunca teve um apelido? No mundo do futebol é quase uma regra. Passa a ser a identidade do craque, dentro e fora de campo. Quem, por exemplo, lembra do combativo zagueiro Osvaldo da Silva Sampaio,que durante muitos anos impôs respeito na zaga do Fast. Pois bem, se do Osvaldo nem os fastianos fanáticos recordam, do Purgante ninguém consegue esquecer. Por que Purgante? Bom, talvez pelo efeito da valentia diante dos atacantes.

Lembro alguém que tinha um verdadeiro horror a apelidos. Na primeira quinzena de setembro de 1965, chegou a Manaus um treinador paraense disposto a acabar com a farra dos apelidos. José Maria Moraes, que sucedeu Juarez de Souza Cruz no comando do ”tricolor cintado”, no primeiro treino no campo do Vila Rica, foi logo bronqueando ao ouvir alguém chamando Osvaldo Sampaio de Purgante: “não admito apelidos. Daqui para a frente todo mundo terá que ser chamado pelo seu verdadeiro nome. A partir daí o goleiro Negão teria que ser tratado por Edílson, e ai de quem ousasse chamar o ponta direita de Tapioca. Teria que descobrir que Tapioca era Carlos Alberto.

Mas a vontade do retranqueiro técnico nunca foi levada muito a sério pela crônica esportiva e pelos torcedores. Eu jamais consegui descobrir os verdadeiros nomes do lateral Cabrinha e do goleador Torrado. Aliás, de nenhum dos três Torrados. Quanto aos outros dois mais jovens, um formou-se em engenharia e o outro virou sambista. Do mais velho, desconheço o paradeiro.

Com uma lista tão farta de apelidos é possível, sem esforço, formar várias seleções, com os respectivos reservas: Chico Bóia, Farofa, Jorge Baleia, Periquito, Pila, Guarda, Limão, Azedo, Tongato, Chumbinho, Tião Ventilador, Peguei-te, Caica, Lacinha, Português, Gatinho, Dog, Pingüim, Camarão, Cacheado, Pingado, Lapiseira, Borrachinha, Formiga, Cabrinha, Barrote, Bololô, Catita, Rato, Botica, Caroço, Gravata, Paçoca, Bacuri, Picolé, Patrulheiro, Índio, Bioca, Boca Cheia, Saúva, Catingoso, Padeirinho, Zozoca, Timba, Biluca, Jorge Cuíca, Careca, Pretinho, Raspada, Pepeta, Tiquinho, Amor, Parada, Fredoca, Xinxa, Sarará, Tijolinho, Azulão são alcunhas inscritas na história do futebol amazonense.

Para recordar, Chico Bóia foi o goleiro campeão amazonense de 1958, jogando ao lado de Tucupi, Pretinho, Pingüim, e Cacheado, na meritória conquista do Santos Futebol Clube, que era orgulho da rua Borba, no bairro de Cachoeirinha.

O artilheiro do Santos foi João Ferreira Alves, que doente, experimentou o abandono e o esquecimento. Falo de Pretinho, com vitoriosa carreira no Santos, Auto Esporte, Fast, Nacional e América, terror dos goleiros adversários, que precisou da solidariedade dos amigos, pois sem as duas pernas que o ajudaram a marcar tantos gols, amargou dolorosa solidão e muitas dificuldades para sobreviver com dignidade. Do Pretinho, que já nos deixou, só resta uma grande saudade.

Da extensa lista acima, poucos são os nacionalinos capazes de relacionar o nome do professor Antônio Ricardo Peixoto de Lima ao eficiente e habilidoso Rolinha,

jogador que integrou ao lado de Mário Motorzinho, a mais popular formação do time que à época era da rua Saldanha Marinho.

Mas apelido é coisa que nem sempre encaixa de primeira. Lembro de uma certa noite no Vivaldão, quando pela Rádio Difusora, comentava um jogo do América, ouvi a informação do repórter de pista Roberto Augusto de que haveria substituição. No lugar do substituído estava entrando um desconhecido Pedro.

Carlos Carvalho, locutor de voz de privilegiada, que fazia da ironia a sua marca registrada, foi logo dizendo:“ Pedro não é nome de jogador. Pedro é nome de pedreiro”.

Para ajudar, sem nenhuma criatividade, lembrei de uma personagem de uma novela televisiva, procurei completar a informação: “o nome do garoto é Pedro Azulão”. Carlos Carvalho gostou da sugestão e mandou ver na sua narração, destacando a atuação do novato, cuja principal virtude era a impulsão para potentes cabeçadas. Só que Pedro Tupinambá Nobre não gostou do Azulão e por algum tempo andou bronqueando. Mas foi aconselhado pelo técnico Amadeu Teixeira a mudar de comportamento. Pedro seguiu o conselho do mestre, esfriou a cabeça, firmou-se como titular e virou símbolo de raça no ataque do América. Hoje o empresário Pedro, sobrinho do craque Orleans Nobre, em qualquer lugar, se alguém chamá-lo de Pedro Azulão, ele atende, com bom humor e sorriso nos lábios. (Nicolau Liborio é Procurador de Justiça, Jornalista e Radialista – [email protected])