Essa noção imaterial, conhecida como sabedoria popular, ensina a existência de quatro coisas que não devem ser feitas sob nenhuma circunstância. São elas: nadar contra a correnteza, correr na frente de trem, ensinar caminho a doido e esperar por quem não vem. Tenho cá comigo a forte impressão de que o nosso país atravessa tempos em que essas lições não só estão deixando de ser aplicadas, mas, ao contrário, está-se a agir, deliberada ou inconscientemente, no sentido de fazer tudo aquilo que não é recomendado.
Tomemos o caso do Congresso Nacional. Composto por oitenta e um senadores e quinhentos e treze deputados, revelou-se, na maioria, um depósito de espertalhões de todos os matizes. Todos se lembram da expectativa gerada, quando, há poucos anos se anunciou que seria divulgada a tal Lista do Fachin, espécie de compilação de corruptos, cuja publicação, no final das contas, acabou como o parto da montanha, eis que não apresentou qualquer novidade. Não causou nenhuma estranheza. Mas, por outro lado, deu ensejo à aplicação inversa de um dos princípios mais caros à democracia, qual seja o da presunção de inocência.
A uma opinião pública desinformada, raiando a ignorância, alia-se uma imprensa tendenciosa, de tal forma que a simples referência feita por um delator (figura deplorável e indigna) tem o condão de transformar uma pessoa em réu julgado, condenado e execrado. Nesse carnaval de insensatez, o judiciário dá contribuição formidável, espetaculizando atos processuais que, em tempos de lucidez, fariam parte da mera e cansativa rotina forense. Ensina-se caminho a doido quando se determina condução coercitiva sem que tenha havido prévia intimação do conduzido. E nada-se contra a correnteza quando se tenta explicar tamanha e tão óbvia incoerência.
As consequências não podem ser mais estapafúrdias. Bradam algumas gralhas que os políticos são a causa e o berço de todos os males da nacionalidade. Ainda que o fossem, não tem nenhum sentido pretender vivenciar a democracia sem a prática da política. Para conciliar os dois pontos seria suficiente, penso eu cá na minha insignificância, que não se elegessem políticos desonestos, desses que não possuem passado, mas apenas folha corrida. Mas, que nada! O indivíduo diz em público que possui uma fortuna de milhões de reais, sem dar a menor explicação de como, onde e quando conseguiu amealhar tanto dinheiro, e, mesmo assim, obtém carradas de votos que o conduzem e reconduzem ao posto que ele haja por bem pretender.
Até porque, e a estupidez não tem lógica, sendo impensável fazer campanha política sem dinheiro, quem não for rico e for honesto vai fazer papel de besta se se arvorar a uma disputa eleitoral. Traduzindo: o próprio sistema incentiva o gasto desenfreado de dinheiro, já que, não se tendo notícia de que este caia do céu ou brote no quintal, consegui-lo em grande quantidade há de exigir malabarismos que evidentemente vão tangenciar todas normas legais aplicáveis à espécie.
Já se vê que eu próprio estou correndo na frente de trem. De um trem avassalador, sem freio, sem maquinista ou motorneiro. Paciência! Recuso-me ao conformismo exangue e semimorto. Não vou nunca assimilar o “complexo de vira lata” que se espraiou pela nação e que insiste em auto depreciação de tudo o que é brasileiro. Longe disso. A crença no meu país não foi forjada em escola. Ela nasce do próprio amor pela Pátria que, sempre acreditei, está cima de todo e qualquer fator conjuntural. Se não deixarmos que as raposas se aproximem do galinheiro, não vão elas poder continuar na farra que nos enlameia.
Sei que é difícil isso. Mas (e isso eu aprendi na escola), “vencer sem luta é triunfar sem glória”. É imperioso tomar o destino do Brasil em nossas próprias mãos, conscientes da advertência de Vandré, segundo o qual “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Se os chamados Poderes da República estão viciados e contaminados, apliquemos-lhes medicamentos de choque. O doente pode até entrar em coma, mas há de ressurgir revigorado e com nova disposição. Não podemos é deixa-lo morrer por conta de seus próprios vícios.
Estou esperando por quem não vem? Não sei. Só tenho certeza de uma coisa: por mais longa que seja essa espera (e o meu tempo já se faz curto), ela há de ser recompensada. Se não vou conseguir ver raiar “a liberdade no horizonte do Brasil”, meus netos, ou os filhos deles, haverão de ter a certeza de que o “auriverde pendão da minha terra” não serviu “a um povo de mortalha”. Destinos mais elevados estão traçados para a Pátria. Não terá eco a voz dos idiotas que clamam pela volta da ditadura. Também não vão proliferar os arreganhos fascistas dos que, julgando-se donos da verdade, acreditam poder continuar enganando o povo. Acima deles há uma coisa maior e mais sublime, chamada Brasil. Creio nisso.(Félix Valois é Advogado, Professor, Escritor e Poeta – [email protected])