Teatro Amazonas – Por Nicolau Libório

Doutor Nicolau Libório (AM)

Muitos falam de magia e de força sobrenatural. Fantasma? Só o da ópera. O lugar é encantador e envolvente, o que motivou Luciano Pavarotti, em plena quarta-feira de cinzas de 1995 a realizar um antigo sonho: cantar no palco de Teatro Amazonas. O tenor que estava a passeio por Manaus premiou um pequeno e privilegiado grupo que se fazia presente com interpretações de trechos de óperas. Poucos demonstram interesse em colocar em dúvida a existência de fantasmas que continuariam a perambular pelas dependências do majestoso templo de arte. Mesmo porque a bela história da marcante obra de Eduardo Ribeiro é muito mais interessante.

Segundo o saudoso professor e historiador Mário Ypiranga Monteiro, o primeiro teatro coberto que existiu em Manaus foi o Thalia, também conhecido como “porco-espinho”, de propriedade do carnavalesco Joaquim José da Silva Pingarilho nos anos 1850, que ficava localizado na esquina das ruas Marquês de Santa Cruz com Miranda Leão. Depois vieram o Éden, na Praça Dom Pedro II, o Eldorado, o Apolo, o Cassino Julieta, que virou Cine Alcazar, depois Cine Guarany e, finalmente uma agência do banco Itaú, na rua Floriano Peixoto.

Mas essas casas de espetáculos não atendiam as condições mínimas para atender um público refinado, pois eram desprovidas de acomodações confortáveis e desaparelhadas para abrigar grandes companhias líricas, sobretudo pela precariedade dos seus recursos técnicos. Manaus já possuía espectadores seletos, conhecedores de grandes centros de cultura, que reclamavam e exigiam a construção de uma casa de espetáculo capaz de atender a uma plateia qualificada. A Paris dos trópicos ainda vivia os reflexos na área econômica que os seringais proporcionavam. A borracha era a grande alavanca para o progresso da cidade. Sobre isso o ex-governador Artur César Ferreira Reis destacou que o teatro surgiu da necessidade cultural e também do crescimento econômico, que fazia aumentar a população e com ela hábitos novos e anseios de progresso. Tudo provocado pela existência de condições novas que se elaboraram com o rush gomífero.

A primeira atitude prática para a construção do nosso Teatro Amazonas partiu do deputado Antônio José Fernandes Júnior, projeto apresentado na sessão da Assembleia Provincial no dia 21 de maio de 1881, que no primeiro considerando procurou deixar claro que “sem haver um edifício próprio não teremos representações teatrais, cuja distração é incontestavelmente de utilidade e muito concorre para a civilização da nossa sociedade”.
Porém a obra somente aconteceu na administração de Eduardo Gonçalves Ribeiro, no quatriênio de julho de 1892 a julho de 1896, quando Manaus possuía apenas 20 mil habitantes.

Registros históricos dão conta que o maranhense de São Luís, após cursar a Escola Militar no Rio de Janeiro, chegou na capital amazonense em 1887, destacado para a região segundo alguns, por punição, pelo fato de ser republicano. Supostamente descendente de escravos, ganhou a simpatia e a confiança dos amazonenses, sendo eleito para enfrentar um grande desafio. Suas obras foram várias e bastante conhecidas: as pontes da avenida 7 de setembro, prédio do Palácio da Justiça, prédio da Imprensa Oficial, prédio do Instituto Benjamim Constant, reservatório do antigo bairro do Mocó (hoje bairro Nossa Senhora das Graças). Mas o seu maior entusiasmo foi pela construção do Teatro , cuja inauguração aconteceu no dia 31 de dezembro de 1896, quando o Amazonas já era governado por Fileto Pires Ferreira. Eduardo Ribeiro, o Pensador, que havia passado o cargo ao sucessor cinco meses antes, presenciou a inauguração na condição de convidado. Foi indiscutivelmente um grande legado deixado pelo visionário Eduardo Ribeiro que transformou a vida de Manaus, antes apenas uma grande aldeia, sem água encanada, sem esgoto e sem luz elétrica.

Foi com a ópera La Gioconda, de Amilcar Ponchielli, em 7 de janeiro de 1897, que o Teatro Amazonas abriu suas portas ao público. Mas entre altos e baixos o nosso teatro teve a sua fase de “elefante branco”. Viveu um tempo de abandono e total indiferença por parte dos nossos governantes. Na administração do Coronel João Walter de Andrade, em 1974, após reparos, na reinauguração não prevaleceu a exibição da ópera La Gioconda, como chegou a ser sugerido. Os sucessos vividos em 1897 já não despertavam o mesmo entusiasmo 77 anos depois. Para alguns a ideia de ópera não empolgava, não representava sucesso financeiro, por ser enfadonha.

O tempo passou, as pessoas passaram, as transformações aconteceram e, na restauração de 1996, feita pelo governo Amazonino Mendes, Festival de Ópera passou a ser interessante. Carmen, La Traviatta, O Barbeiro de Sevilha foram espetáculos que fizeram parte da primeira edição das grandes atrações. Outros festivais vieram e muitos outros virão. Se Pavarotti fez da sua apresentação surpresa um fato que mereceu destaque na imprensa internacional, José Carreras, o outro grande tenor, foi merecedor de muitos aplausos, no dia 27 de fevereiro de 1996, interpretando composições de Carlos Gomes.
Falar que o Teatro Amazonas é belo é uma adjetivação incompleta.

Tudo ou quase tudo chama atenção: as cadeiras de veludo com espaldar arredondado, o pano de boca do palco onde está pintado o Encontro das Águas, as colunas que homenageiam com os nomes poetas e músicos; as quatro pinturas do teto que evidenciam a dança, a tragédia, a música e a poesia. O palco do nosso teatro, nesses quase 123 anos sempre foi muito acolhedor, cedendo espaço para peças líricas, teatrais e atrações populares. Bravo!(Nicolau Libório é Procurador de Justiça, jornalista e radialista – [email protected])