Escrevi outro dia que, na condição de repórter esportivo, vivi a grande fase do esporte e do rádio amazonense . Para ser mais preciso, a grande fase da crônica esportiva. Tenho certeza que não exagerei. Os tempos eram outros, claro, as alternativas de lazer eram poucas , mas o idealismo, a dedicação e o entusiasmo eram as eficientes ferramentas que usávamos para promover os espetáculos.
O tempo passou, vários companheiros sairam de cena, alguns seguiram o caminho da eternidade e a crônica esportiva não experimentou um processo de renovação. Desejo lembrar hoje de alguns brilhantes nomes de uma época marcante: Luiz Rougles, Teófilo Mesquita, Francisco Puga, Jander Santos, Geraldo Viana, Flávio Seabra, Arnaldo Santos, João Bosco, Albany Mota, Jayme Barreto, Ary Neto, Airton Brito, Leal da Cunha.
Lembro de CARLOS CARVALHO, narrador de voz privilegiada e de estilo inconfundível, que por muitos anos garantiu a grande audiência da Rádio Difusora. Carlos era um homem simples, autêntico, sem vaidade e sem ambições. Pela sua irretocável postura ética, chegava a ser puro demais para os padrões atuais. Com ele, por muitos anos, participei de memoráveis transmissões. Seu estilo de narração despertava atenção de uma grande legião de admiradores. A descrição dos lances, que na voz de um locutor inexpressivo não teria a menor graça, com ele era diferente. E os ouvintes, milhares por sinal, quando ouviam ele dizer com entusiasmo “atira para o arco” já sabiam que a seguir viria o grito de gol. Carlos Carvalho, pelo seu profissionalismo e pelo nobre caráter, merece ser lembrado e homenageado sempre.
Conheci FLAVIANO LIMONGI, pessoalmente, em 1966, por ocasião do movimento para a fundação da Federação Amazonense de Futebol. Homem educado, atencioso, de bem com a vida, que soube granjear a simpatia de todos. Lembro que em novembro de 1969, quando o futebol amazonense fervia em emoções e as equipes esportivas das emissoras de rádio disputavam para valer preciosos pontos de audiência, tive a ideia de entrevistar o governador Danilo Duarte de Matos Areosa, a fim de que ele anunciasse a data da inauguração (ou pré-inauguração) do estádio Vivaldo Lima. Corri até a sapataria Limongi e pedi o apoio de Flaviano, à época presidente da FAF, e que era grande amigo do governador. Fui atendido na hora. Ao chegar ao Palácio rio Negro, com a influência do velho amigo Limongi, tive acesso ao gabinete do Dr. Danilo, que anunciou aquilo que eu e os ouvintes gostariam de ouvir.
JOÃO DOS SANTOS PEREIRA BRAGA foi um grande mestre, um grande amigo. No rádio, devo-lhe a primeira oportunidade na Rádio Baré. Após brevíssima iniciação em A Crítica, foi com ele , sob o seu comando, em A Notícia, que enfrentei para valer o batente em uma redação de jornal. Anos depois, formamos a dupla de comentaristas que poderia até não ser a melhor mas, com certeza, por mais de uma década, garantiu o ibope da nossa Difusora. E mais: aprendi com João Braga, meu professor na Faculdade de Direito, no início dos anos 1970, a conhecer o caminho das pedras na área jurídica. Com ele, quando exerci o cargo de Delegado de Polícia, por longos sete anos, dissipei muitas dúvidas. Quando prestei concurso para o Ministério Público em 1984, foi um dos meus maiores incentivadores. Já no de cargo de Promotor de Justiça, iniciando a carreira pelo interior, nunca dispensei suas valiosas orientações. Tendo sido professor da minha mulher Soraya e da minha filha Danielle, também na área do Direito, João Braga foi um grande amigo da família. Ex-secretário de Estado, Ex-chefe do Ministério Público, Jornalista, professor, advogado, Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, Braga bem que poderia ser vaidoso. Mas ele foi exatamente o mais perfeito exemplo de simplicidade.
Na metade dos anos 1960 fui levado por Messias Sampaio para a Rádio Rio Mar. A equipe contava com pouca gente (Belmiro Vianez, Osny Araújo, Carlos Alberto Alves, José Rayol e Messias Sampaio). Difusora e Baré disputavam a ponta da audiência. A emissora da Colina se ressentia da perda de Mário Emiliano, vítima da sua frágil saúde. Mas de repente, com volta do LELO, que que havia passado uma temporada no Rio de Janeiro, a coisa mudou. E para melhor. LUIZ EDUARDO LUSTOSA DE OLIVEIRA, talento revelado por Mário Emiliano, chegou a à chefia da equipe esportiva da Rádio Rio Mar. Foi com ele, profissional dinâmico e organizado que aprendi que uma transmissão esportiva não pode ser feita apenas na base do improviso. Ele ensinava que trabalho em equipe pressupõe organização. Por isso, semanalmente, reunia com os narradores, comentaristas, repórteres e plantonistas para avaliar o desempenho de cada um. Gostava de ver o trabalho em harmonia, tudo bem entrosado.
Foi Luiz Eduardo que me deu a oportunidade de ser o primeiro repórter amazonense a participar de uma transmissão esportiva no estádio do Maracanã, no dia 12 de junho de 1968, no jogo Brasil e Uruguai, na decisão da Copa Rio Branco(o narrador foi José Augusto Roque da Cunha e Orlando Rebelo, o comentarista). Foi com Luiz Eduardo, com José Augusto Roque e Belmiro Vianez que cheguei à Rádio Difusora, em 1969, para formar uma das maiores equipes do rádio, porque fomos nos juntar a João Bosco Ramos de Lima, Carlos Carvalho, Jota Nunes, Osias Santiago, Luiz Saraiva, Paulo Soares e outras feras. Com o Lelo cheguei a TV Amazonas, no tempo em que a emissora do dr. Phellipe Daou ainda transmitia a programação da Rede Bandeirantes. Juntos ingressamos na Faculdade de Direito, no começo dos anos 1970. O tempo passou , hoje ele exerce a advocacia e eu sou Procurador de Justiça. A sua paixão pelo esporte transformou-se em desencanto, mas quando nos encontramos , buscamos nas nossas memórias fatos que marcaram as nossas vidas no esporte e nos bancos da nossa velha “jaqueira” da Praça dos Remédios.
Nascido em Sena Madureira, o acriano VALDIR CORREIA DE MELO, torcedor do Rio Negro e do Botafogo, conheceu o sabor das vitórias, nos gramados da Colina e do Parque Amazonense, vestindo a camisa do juvenil do Nacional. Concomitantemente, dava as primeiras investidas na área radiofônica , em 1967, na Rádio Tropical, com o nome de Valdir Melo. Para não ser confundido com o goleiro do São Raimundo, ao chegar a Rádio Baré, tempos depois, preferiu evidenciar o Correia. Na Rádio Rio Mar ganhou espaço e, de repente, passou a integrar o quadro de narradores. Pela admiração que nutria pelo locutor José Carlos Araújo, da Rádio Globo, que era tratado por “garotinho” passou a assimilar o estilo do versátil narrador e já chegou na Difusora , na segunda metade dos anos 1970 com a bola toda. Com ele, por alguns anos, formei dupla na leitura da resenha esportiva. Juntos estivemos em muitas jornadas esportivas. Valdir, hoje, é uma referência no rádio amazonense.
Com atuações nas rádios Rio Mar e Difusora, longas passagens pelo Jornal do Comércio e A Crítica, CARLOS ZAMITH DE OLIVEIRA faz parte da história do esporte amazonense. Com a bola nos pés, apenas uma discreta participação como zagueiro. Integrou o time da empresa J.G. Araújo obedecendo as orientações técnicas do lendário Alfredo Barbosa Filho. Ele é história por muitas razões. É fundador da Associação dos Cronistas e Locutores Esportivos do Amazonas e da Federaçào Amazonense de Futebol, com eficientes atuações nas diretorias das duas entidades. Com a sua coluna Baú Velho, ganhou leitores em todas as camadas sociais. Zamith era o tipo da pessoa confiável, que sempre trabalhou pelo esporte por esporte, por puro prazer.
Falando de BELMIRO VIANEZ, seus comentários nem sempre agradavam a todos. Os seus admiradores liam ou ouviam por pura simpatia. Os outros queriam sempre saber o que Belmiro Vianez tinha a dizer sobre determinado fato ou pessoa. A verdade é que ele nunca fez questão de ser unanimidade. Ele era apenas um comunicador. E dos bons. Foi apresentador de grandes eventos, articulista de jornal, comentarista esportivo, inclusive na televisão. Teve uma longa atuação nas nossas principais emissoras de rádio da época.
Lembro de um fato marcante quando já estávamos na Rádio Difusora, por ocasião da pré- inauguração do estádio Vivaldo Lima, no dia 5 de abril de 1970. No jogo preliminar entre as seleções B do Brasil e do Amazonas , recomendou que eu deveria entrevistar o autor do primeiro gol no novo estádio. Quando Dario colocou a bola na rede do goleiro Maneco, não perdi tempo, invadi parte do gramado e ouvi o artilheiro. Fui expulso pelo árbitro Arnaldo César Coelho. Mas foi só uma expulsão sem maiores conseqüências porque eu continuei trabalhando normalmente. E os ouvintes gostaram.
Belmiro era um sonhador com os pés no chão, um otimista que detestava a mesmice. Com a sua voz empostada, firme, quando necessário não economizava críticas , nem mesmo contra o seu “Olympico dos meus amores”clube da sua preferência. O empresário/comunicador deixou muitas saudades no coração dos amigos e dos seus milhares de leitores e ouvintes.
Sobre JOSÉ AUGUSTO ROQUE DA CUNHA, excelente locutor esportivo que marcava a sua narração pela vibração e pela riqueza de detalhes, tenho boas lembranças. Com ele estive pela primeira vez no estádio do Maracanã, em 1968, na transmissão do jogo Brasil e Uruguai. Ele envolveu-se com o esporte por puro prazer. Mesmo exercendo a direção maior do SENAI, ele arranjava tempo para se dedicar ao rádio e, posteriormente a televisão, quando ela chegou por aqui. A sua presença está marcada na história da TV Amazonas.
A última vez que estivemos juntos aconteceu num encontro promovido pelo Conselho Estadual de Desportos, em setembro de 2001, na Vila Olímpica de Manaus. Lá, numa noite marcada pela simplicidade e pela emoção, eu , ele e outros velhos companheiros, recebemos CERTIFICADOS DE RECONHECIMENTO pelos bons serviços prestados ao esporte. Naquela noite relembramos um certo jogo, na Colina, entre Nacional e Fast.
Uma tarde de domingo, arquibancadas lotadas, no final dos anos 1960, por volta dos 20 minutos do segundo tempo, jogo duro, placar de zero a zero, o ponta Zezé, do Nacional, passa pelo lateral Pompeu, do Fast e cruza para a área. Na hora , o centroavante Pretinho tropeça e cai sozinho. José Augusto, que descrevia o lance ao microfone da Rádio Rio Mar, não deixou por menos: é pênalti! Pênalti em favor do Nacional. Eu, na condição de locutor de pista, posicionado em condições de informar sobre o lance, pois estava bem atrás do gol do Fast, mesmo sendo torcedor do Nacional, disse o que havia visto. De nada adiantou, porque José Augusto, movido pela sua grande simpatia pelo nosso Nacional, foi logo interrompendo com a mesma frase, dessa vez com a ênfase, a rispidez e a paixão de um torcedor contrariado: Libório, me parece penal, Libório! O jogo prosseguiu, o Nacional venceu e José Augusto até esqueceu do tal pênalti não marcado. No nosso último encontro o fato foi lembrado, fazendo o José Augusto dar uma gostosa gargalhada.(Nicolau Libório é Procurador de Justiça, Jornalista e Radialista – [email protected])