ZEZINHO ERA GRANDE NA ZAGA – Por Nicolau Libório

Procurador Nicolau Libório(AM)

No Atlético Eldorado Clube, lá do bairro de Aparecida, o dr. Francisco Rebelo de Souza era o homem dos sete instrumentos: presidente, técnico, diretor de futebol, diretor de finanças, relações públicas, preparador físico e, principalmente, torcedor. Homem de recursos e de um grande ideal, conseguiu elevar o seu modesto Eldorado à primeira divisão, nos anos 1950, chegando a disputar jogos decisivos com os considerados times grandes da época.

Além de Jaime Rebelo (anos depois foi diretor da Rádio Baré), filho do velho advogado Francisco, o elenco era constituído por atletas do próprio bairro. Mas também não era qualquer um. Para vestir a camisa do Eldorado era necessário que o indivíduo preenchesse alguns importantes requisitos. Além de boas qualidades técnicas, teria que treinar com regularidade e, sobretudo, ser disciplinado.

E foi por essas e outras virtudes que o garoto José Lopes de Souza, filho do sêo Francisco Lopes e de dona Maria Amélia, conseguiu chegar facilmente a condição de titular da zaga do quadro aspirante. Mas a sua promoção ao time principal aconteceu muito rapidamente. E não era para menos. Jogava com elegância, categoria e, quando necessário, não deixava de ser um pouco ríspido para impor respeito na defesa.

-Naquela época eu morava no bairro Aparecida, na rua Bandeira Branca. Aliás, foi onde eu vivi toda a minha infância. Conhecia o dr. Francisco, que era um homem fabuloso. Ele tinha muito amor pelo que fazia e o seu grande ideal de trabalhar pelo esporte é que conseguia garantir o prestígio da agremiação

Mas José Lopes de Souza, que já havia recebido o apelido de Zezinho, jogava demais para permanecer num time pequeno. Certo dia, no início de 1955, depois de uma conversa com o seu amigo Almério, que jogava no Fast, resolveu trocar de camisa. É claro que pela do Fast, seu clube de coração, sua dedicação teria que ser bem maior.

Zezinho encarou firme a ideia, embora soubesse que, vez por outra, teria que driblar a atenção do seu patrão, Benjamim Alves, para dar uma ligeira escapadinha, para não se ausentar dos treinamentos.

-Sabe como é que é, naquele tempo o futebol não tinha a divulgação que tem hoje. Então eu procurava inventar uma desculpa, mas não perdia o treinamento.

E foi exatamente em 1956 que Zezinho conseguiu sentir o agradável sabor da conquista de um título. O Fast possuía um time para ninguém botar defeito. Lá jogavam Paulo Onety, Paulo Lira, Padeirinho, Dog, Orleans Nobre e, como se todos esses não bastassem, ainda apareceu Zezinho para infernizar a vida dos times adversários. O título conquistado de forma invicta transformou o Fast na grande força do futebol amazonense.

-Aquele time nos dá saudade. Paulo Lira era um excelente ponta esquerda. Paulo Onety um craque de extraordinária categoria. Padeirinho sabia perfeitamente o que fazer com a bola dentro da área. Lembro da formação do time quando ganhei o meu primeiro título de campeão. O Fast jogou a final com Raul, Gurgel e Morcego; Zezinho, Dog e Nego; Padeirinho, Marcelo, Guilhito, Paulo Onety e Paulo Lira.

Os dois anos seguintes o Fast decaiu um pouco. Mesmo assim ainda esteve entre os finalistas. Durante esse período, o futebol vistoso de Zezinho foi reconhecido pelo treinador João Liberal, que decidiu chamá-lo para integrar a seleção amazonense. Na seleção, no primeiro treino, apesar de concorrer com Almério, Gilberto e Venâncio, garantiu com relativa tranqüilidade o seu posto de titular.

Vencida a primeira parte, com o Amazonas vencendo as seleções de Rondônia, Acre e Boa Vista (hoje Roraima), houve um sério desentendimento entre o técnico João Liberal e o presidente da Federação Amazonense de Desportos Atléticos. Liberal ficou bastante aborrecido e pediu para sair. Na mesma oportunidade, o zagueiro Boanerges, acusado de haver cometido indisciplina, foi afastado. E diante dessa situação o clima não ficou nada agradável.

-Eu era muito amigo do sêo João Liberal. No momento em que ele foi afastado do time, ele e o Boanerges, eu decidi ser solidário. Sai também e nunca mais voltei a vestir a camisa da seleção.

Para quem sempre teve a cabeça no lugar e os pés no chão, o fato de haver saído da seleção não teve grande influência. Mesmo porque paralelamente a sua atividade esportiva, procurava se dedicar aos estudos. Com um certo sacrifício, formou-se em Contabilidade e somente não chegou à Universidade, porque naquele tempo, em Manaus, só existia a Faculdade de Direito, curso que não era da sua preferência.

Em 1960, Zezinho já havia se afastado dos gramados. Dedicava seu tempo à empresa Credi-Alves, localizada na avenida Eduardo Ribeiro, onde exercia um cargo de destaque. Mas certo dia não resistiu ao convite do seu amigo Lafayete Vieira (Desembargador aposentado) e concordou em jogar as duas partidas finais pelo seu amado Fast, que enfrentava uma certa carência para organizar o seu setor defensivo.

Entrou no time, jogou as duas partidas, ganhou mais um campeonato e decidiu parar de vez. Com 23 anos, muito futebol pela frente, optou em cuidar da sua vida particular. A sua saída foi lamentada pelos companheiros e pelo próprio treinador, mas a sua decisão foi respeitada.

-Quando eu jogava futebol, existiam dois jogadores que eram uma parada para marcar. Um era o Português, que era muito técnico e precisava muito jeito para desarmá-lo. O outro era o Vitorino, que quando partia para a área ia com muita determinação. Os outros eu conseguia dar o meio jeito sem grandes dificuldades.

Zezinho sente satisfação de nunca haver machucado ninguém. Até mesmo na hora de jogar de uma forma mais dura, mais viril, tinha o cuidado de chegar sempre na bola e por isso dificilmente chegava a ser advertido pela arbitragem.

-Nunca fui de me empolgar com o futebol. Jogava porque gostava mas não cometia exageros. E graças a esse meu comportamento eu só consegui fazer amigos. Aliás, veja bem, as minhas grandes amizades eu fiz no futebol. Essas amizades até hoje são conservadas. Isso tudo me deixa muito feliz.

Zezinho começou a enfrentar o batente muito jovem, assegurou a sua estabilidade financeira ao arriscar a sorte no ramo de confecções em 1964. Ao sair do Credi-Alves, onde começou como office boy e saiu como sócio-gerente, montou a sua primeira loja: Casa Nova Magazin. O negócio deu tão certo que tempos depois montou a Milano Magazin, também na Eduardo Ribeiro. Expandiu o negócio, inaugurando, a seguir, a Play Boy.

Longe dos gramados, Zezinho chegou a ajudar o atletismo para estimular a preferência esportiva dos filhos Frederico e Franklin. Mas o futebol, para ele, sempre mereceu atenção especial. Hoje quando alguém se refere a ele, lembra do Zezinho Casa Nova.(Nicolau Libório é Procurador de Justiça, Jornalista e Radialista – [email protected])