A juíza Aline Marcovicz Lins, titular da 1.ª Vara de Iranduba, decidiu suspender o cumprimento da liminar de reintegração de posse relativa à área conhecida como “Comunidade Vera Lúcia Castelo Branco”, que fica dentro do Projeto Integrado de Colonização (PIC) Bela Vista, naquele Município. A reintegração – que afetaria cerca de 200 famílias que vivem no local há cerca de 10 anos – havia sido concedida anteriormente pelo Juízo da Comarca nos autos de n.º 0600594-19.2021.8.04.4600.
O anúncio foi feito pela magistrada ao final da audiência pública realizada na manhã desta quinta-feira (02/12) como parte da fase de instrução do processo. A audiência pública aconteceu no Plenário da Câmara Municipal de Iranduba, das 9h50 às 12h, e foi conduzida pela magistrada. “Não estou dizendo que os senhores (moradores da área em litígio) estão certos, tampouco dizendo que o autor (da ação) não tem direito. Estou suspendendo o cumprimento da liminar em razão do estado de pandemia”, afirmou a juíza.
Ao suspender a liminar de reintegração de posse, a juíza determinou que sejam oficiados o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para que o órgão, no prazo de 10 dias, informe se a titularidade do imóvel em litígio é federal ou estadual, bem como a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema), que deverá informar se a área em questão faz parte de uma Área de Preservação Ambiental (APA), cujos procedimentos de desapropriação ou moradias são distintos.
“Diante da situação de que seria mais prejudicial retirar os atuais moradores da área do que mantê-los lá, e diante da pandemia, onde muitos não teriam para onde ir, foi suspenso o cumprimento da decisão. O próximo passo será a citação de todos os réus e de todos que moram na comunidade e, inclusive, pela Defensoria Pública, para que apresentem a sua contestação”, explicou a juíza.
Autocomposição
A juíza havia decidido pela realização da audiência pública em observância ao Código de Processo Civil, que em seu artigo 139 trata da autocomposição, e no artigo 565 dispõe sobre os conflitos fundiários onde a turbação tiver ocorrido há mais de ano e dia, ou quando a liminar não tenha sido executada após o prazo de um ano, permite ao magistrado designar audiência de mediação para a solução pacífica do conflito.
O objetivo foi ouvir as partes envolvidas e, dentro de uma concepção democrática deliberativa, convocar outros agentes da sociedade para qualificar os debates e garantir uma solução mais justa e adequada. Segundo a magistrada, embora não tenha sido possível um acordo entre as partes – a finalidade da audiência era tentar uma composição entre os envolvidos –, o resultado da audiência foi positivo. “Quando estamos em uma democracia temos que dar direito de voz a todos, preferencialmente, a quem não têm direito de voz, como os mais humildes, que é o caso das pessoas dessa comunidade”, afirmou a juíza Aline.
A magistrada destacou que o processo em questão não trata dos interesses de uma pessoa, mas de uma comunidade inteira. “Quando você garante essa representatividade para eles, aumenta a credibilidade, inclusive, do Poder Judiciário, e a qualidade da decisão judicial que será proferida posteriormente”, disse a titular da 1.ª Vara de Iranduba.
A audiência pública contou com a participação do prefeito do Município, José Augusto Ferraz de Lima; do procurador-geral do Município, Almir da Silva Prestes; de representantes do Núcleo de Moradias Fundiárias da Defensoria Pública do Estado (DPE/AM); do Ministério Público Estadual (MPE/AM); de parlamentares; da Comissão Pastoral da Terra (CPT) da Arquidiocese de Manaus; e de lideranças e moradores da Comunidade Vera Castelo Branco. Com o plenário na sua capacidade máxima esgotada e muitas pessoas na área externa da Câmara, a sessão teve reforço de efetivo por parte da Polícia Militar do Amazonas, que atendeu pedido formulado pela Assistência Militar do Tribunal de Justiça e 1.ª Vara de Iranduba.
A juíza Aline Marcovicz Lins parabenizou a todos os servidores do Judiciário da Comarca envolvidos na realização da audiência pública desta quinta-feira. “A 1.ª Vara de Iranduba tem servidores muito engajados e todos se disponibilizaram a, de algum modo, colaborar com essa audiência, diante da complexidade que envolve a realização de tal ato. Portanto, somente tenho a agradecer a todos.
Nenhum juiz trabalha sozinho. Para que uma Vara funcione é necessário o engajamento de todos os servidores, e isso está ocorrendo aqui em razão da dedicação de cada um que aqui atua”, afirmou a magistrada.
Pacificação social
De acordo com a juíza Aline Kelly, a ocupação que está sendo objeto do litígio ocorreu há dez anos, e representa uma das maiores ocupações, senão a maior, existente no Município. “Desse modo, não se faz suficiente a atuação judicial para a mera solução da lide jurídica, a lide sociológica, adjacente ao pedido de reintegração deve ser, dentro dos limites impostos pela legislação, resolvida da forma mais ampla possível, posto que, a real finalidade da ordem jurídica é a pacificação social”.