A Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região – AM/RR (TRT11) manteve a sentença que considerou lícita a contratação de pessoal por intermédio de fundação privada para prestação de serviços na atividade-fim do Hospital Universitário Francisca Mendes (HFM). O colegiado rejeitou o recurso do Ministério Público do Trabalho (MPT), que alegava tratar-se de terceirização ilícita com violação ao princípio da exigência de concurso público.
Conforme consta dos autos, o hospital é gerido atualmente pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam) – que passou a integrá-lo ao sistema de ensino, pesquisa e extensão da área de saúde – e pela Fundação de Apoio Institucional Rio Solimões (Unisol), responsável pela contratação dos terceirizados. A Unisol é uma entidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, que presta apoio à Ufam em suas atividades de pesquisa, ensino e extensão.
A controvérsia sobre a terceirização da atividade-fim na área da saúde foi analisada pela Primeira Turma do TRT11 no julgamento do recurso interposto pelo MPT nos autos da ação civil pública em tramitação na Justiça do Trabalho desde 2009.
O órgão ministerial reiterou os argumentos da petição inicial e requereu, dentre outros pedidos apresentados, a declaração de nulidade das contratações de empregados sem a realização de concurso público e o afastamento de todos os terceirizados do Hospital Francisca Mendes.
Além disso, o recorrente pleiteou a determinação judicial de que o Estado do Amazonas se abstenha de celebrar termos de parceria, convênios, contratos de gestão, de prestação de serviços ou qualquer outro negócio jurídico com entidades públicas ou privadas para fornecimento, complementação ou intermediação de mão-de-obra para atuação na atividade-fim de hospitais ou unidades de saúde pública. Requereu, ainda, a condenação do ente público estadual ao pagamento de R$ 5 milhões a título de indenização por danos morais coletivos.
Ao relatar o processo, o desembargador David Alves de Melo Junior entendeu que o contrato administrativo firmado entre os reclamados, com objetivo de manter em funcionamento o hospital universitário, e os demais contratos dele oriundos observaram todas as formalidades legais, não tendo sido provada qualquer irregularidade. “O deferimento dos pedidos colocaria o Judiciário na posição de gestor de contratos administrativos, ofendendo o princípio da separação dos poderes, além de ameaçar o funcionamento dos serviços, expondo a risco de colapso a saúde no Estado do Amazonas”, argumentou o relator em seu voto.
A decisão ainda é passível de recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Legislação e jurisprudência
Com base em todas as provas dos autos, o desembargador David Alves de Melo Junior explicou que a parceria entre Estado do Amazonas, Ufam e Unisol para gestão do Hospital Francisca Mendes teve início com o contrato administrativo nº 18/2003, já expirado, e atualmente se encontra sob a égide do instrumento nº 42/2008, objeto da presente demanda.
Segundo o MPT, apesar de formalmente válido, o contrato administrativo nº 42/2008 constituiria terceirização ilícita dos serviços de saúde, permitindo a contratação de mão-de-obra por entidade interposta, sem prévia aprovação em concurso público, o que caracterizaria violação ao art. 37, II, da Constituição Federal.
O relator, entretanto, manifestou entendimento diverso ao apresentando pelo recorrente. Conforme argumentou na sessão de julgamento, a tarefa do Estado na execução de ações e serviços públicos de saúde admite a parceria com o setor privado, com fundamento nos artigos 197 e 199, §1º, do texto constitucional. Outro ponto destacado refere-se à atuação complementar da iniciativa privada nos serviços públicos de saúde permitida pela Lei n. 8.080/90, que regulamentou o Sistema Único de Saúde (SUS).
Nesse contexto, ele destacou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) proferida em dezembro de 2015, que se manifestou sobre o tema na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.923, em que se discutia o modelo de gestão por organizações sociais. “No voto vencedor, o ministro Luiz Fux deixou consignada a constitucionalidade das parcerias com o terceiro setor nas áreas sociais, incluindo a área da saúde”, salientou.
Por fim, o desembargador responsável pela relatoria do processo considerou que a recente jurisprudência fez ruir os argumentos que sustentaram os pedidos da ação civil pública. “O atualíssimo e amplamente majoritário entendimento jurisprudencial acerca do tema permite inferir que parcerias com entidades privadas sem fins lucrativos na prestação de serviços públicos de saúde – como é o caso dos autos – não afrontam a exigência de concurso público, nem configuram terceirização ilícita de atividade-fim”, concluiu.