Danilo Areosa e o Vivaldão – Por Nicolau Libório

Procurador Nicolau Libório(AM)

Numa calorenta manhã do dia 30 de março de 1968, o governador Danilo Duarte de Matos Areosa, festejando o quarto ano da Revolução Militar, chegou à imensa cratera do bairro de Flores para, diante de autoridades militares, auxiliares e jornalistas, anunciar o início das obras do Tartarugão, ou melhor, do estádio Vivaldo Lima. No momento em que um trator do extinto Departamento de Estradas de Rodagem-DER-Am demonstrava que a obra começava para valer, a partir daquele instante, Danilo Areosa garantia ao General Edmundo da Costa Neves, que estava ao seu lado, que dentro de breve tempo o Amazonas teria um dos melhores estádios do Brasil.

Danilo Areosa era um homem muito sereno, de fácil acesso, fácil diálogo, que teve muito equilíbrio no uso do poder. Filho de dona Carlota e do português Antônio Duarte de Mattos Areosa, homem de grandes recursos que instalou a primeira casa bancária em Manaus, Danilo tinha uma vida metódica. Deitava sempre às 10 da noite e às 4 da madrugada já estava acordado, a fim de aproveitar o silêncio para ler ou ficar meditando. No governo, seduzido pelos argumentos do amigo Flaviano Limongi, à época presidente da FAF, transformou-se no mais autêntico dos desportistas, apesar de, no início, não saber estabelecer a diferença entre um tiro de meta e um pênalti.

Empresário de prestígio, mas sem demonstrar o menor interesse por política partidária, jamais poderia imaginar que seu nome pudesse ser lembrado pelos homens do poder. Naqueles anos, os nomes dos governadores eram escolhidos após rigoroso levantamento da vida pessoal. Um certo dia de 1967, foi surpreendido com um telefonema do Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco.

O diálogo teria sido mais ou menos este:

Danilo: Excelência, eu estou a sua disposição.

Castelo: Você vai assumir o governo do Amazonas.

Antes que Danilo tivesse tempo para argumentar, Castelo teria dito: obrigado por aceitar a missão. Esse fato me foi relatado pelo seu filho Antônio José.

Em 1968, primeiro ano do governo Danilo Areosa, Manaus era uma cidade pacata. Ainda não havia a influência da televisão e a principal diversão do povo era o futebol, no Parque Amazonense e na Colina e os cinemas Avenida, Odeon, Guarany, Éden, Popular, Ideal, Ypiranga e Vitória. Então a construção de um estádio de futebol era assunto que a todos interessava. Principalmente no Canto do Fuxico – Henrique Martins com Eduardo Ribeiro-, local preferido para o bate- papo nos fins de tarde, entre políticos, advogados, Promotores, Juízes, aposentados, jornalistas, radialistas e por toda e qualquer pessoa que quisesse gastar o tempo jogando conversa fora. Com o seu nome divulgado diariamente na programação esportiva das rádios e nas páginas dos jornais, o recatado governador passou a ser uma figura verdadeiramente popular.

Mesmo sendo um representante do poder revolucionário, Danilo despertava simpatia. Para levar adiante a sua intenção de transformar em realidade o projeto do arquiteto Severiano Mário Porto, após o pontapé inicial, criou o grupo executivo de construção sob o nome Administração do Estádio de Manaus – ADEM, que passou a reunir sob a presidência do Coronel PM Themístocles Trigueiro, uma vez por semana, em um barracão coberto de zinco, que ficava mais ou menos na área que servia de estacionamento, no lado correspondente à Avenida Pedro Teixeira. Do grupo faziam parte João Teixeira Fernandes Filho, Hugo Silva Reis, João Augusto Souto Loureiro, José Sérgio da Paz, José Cesário de Menezes, Carlos Lins, Irisaldo Godot, Arnaldo Santos e, logicamente, Flaviano Limongi, um dos mais entusiasmados.

O primeiro gol da história do Vivaldão foi marcado por um jogador atarracado, que chegou, anos depois, ao time principal do São Raimundo e que atendia pelo “criativo” apelido de Caroço. E aconteceu exatamente no dia 31 de janeiro de 1969. Naquele domingo, em traje-esporte, Danilo hasteava o pavilhão nacional, antes que aproximadamente 150 garotos das equipes infanto-juvenil dos nossos principais clubes desfilassem pelo gramado. Não houve foguetes, discursos ou homenagens. E, para o governador, nem inauguração. Mesmo porque só havia o gramado, as traves e a imensa esperança de que o estádio seria brevemente uma realidade.

O grande destaque da festa foi o São Raimundo, primeiro campeão da história da nossa praça de esportes que foi derrubada em razão da insensibilidade do governante de plantão.

O gramado pronto, obedecendo processos técnicos altamente modernos para a época, a construtora COINTER LTDA deu seguimento ao trabalho, fazendo os túneis e os vestiários. A parte seguinte foi tocada pela empresa Irmãos Prata, que travava um grande duelo com o radialista Arnaldo Santos, um dos mais exigentes fiscais do trabalho.

Que o estádio foi inaugurado no dia 5 de abril de 1970, com a seleção brasileira, pouca gente desconhece. Mas poucos são os que lembram e muitos são os que não sabem que só na primeira fase da construção foram gastos um bilhão de cruzeiros antigos, numa obra orçada em quatro bilhões. É claro que contou com recursos da Loteria do Estado e, principalmente, das fábricas de refrigerantes Andrade, Luséia, Magistral, Baré, da cerveja Brahma, da Livraria Escolar e de outros seguimentos da iniciativa privada.

Danilo, homem educado e culto, que nunca havia demonstrado o menor interesse pelo futebol ou por qualquer outra modalidade de esporte, contaminou-se. De tanto presenciar a contagiante empolgação da torcida do Nacional, comandada pelo fanático Goiaba, virou nacionalino. Nem mesmo a sua postura discreta conseguia esconder a sua alegria por ocasião dos gols do seu clube “mais-querido”. Por tudo isso, Danilo Areosa merece ser lembrado, com homenagens.(Nicolau Libório é Procurador de Justiça, Jornalista e Radialista – [email protected])