NÃO ÀS BESTEIRAS – Por Felix Valois

Advogado Félix Valois(AM)

Dizer besteira não é apanágio de ninguém. Acho mesmo que todos nós estamos sujeitos a, em um minuto de leseira, deixar escapar alguma tolice. Desculpável, é claro, já que “errar é humano”. Acontece que no mesmo cadinho em que se forjou esse dito popular, forjou-se também o seu complemento, segundo o qual “persistir no erro é ignorância”. Onde fica, então, a figura de Bolsonaro que, já tendo dito besteira ano passado, voltou à ONU com outras tantas?

Segundo ele são o índio e o caboclo os responsáveis pelas queimadas na região amazônica e no Pantanal. É cretinice demais para o meu gosto. Não precisa ser amazonólogo para dimensionar o quanto de tolice vem inserto em uma afirmativa como essa. Índio e caboclo, centenariamente condenados ao menosprezo dos colonizadores, são agora alçados à categoria de infratores cruéis, capazes de atear fogo na floresta talvez para plantar um alqueire de mandioca. O presidente não precisava dizer tamanha heresia para manifestar sua clara opção pelos ideais programáticas da chamada bancada ruralista, em atuação no Congresso Nacional.

Para o presidente o agronegócio não tem, nem de longe, qualquer participação nesse crime ecológico que se repete com ousadia crescente, diante do olhar apático, quase conivente, do Palácio do Planalto. Os órgãos de fiscalização foram ou estão sendo sucateados, seja pela redução de suas verbas, seja pela insuficiência de seus quadros funcionais, tornando impossível a missão de proteção ao ambiente.

E o presidente tem a desfaçatez de se fazer de vítima: são as ONGs as responsáveis por uma verdadeira campanha de difamação contra o Brasil, alardeando as queimadas e sobre elas colocando uma lente de aumento. Os grileiros e os demais exploradores devem achar ótima essa postura presidencial, que os isenta de qualquer responsabilidade pela depredação da Amazônia. Seriam eles figuras patrióticas e heroicas, dispostas a tudo fazer pelo progresso do país, através de investimentos saudáveis aqui nesta região.

Que coisa lamentável! Comportando-se dessa maneira perante o organismo mais graduado no plano internacional, Bolsonaro só nos faz passar vergonha. Que ele não se importe com isso, é problema pessoal dele. Mas não lhe assiste o direito de envergonhar toda a Nação, transformando-nos em objeto de chacota. Com efeito, o estrangeiro mais idiota que possa ser encontrado, se tiver condições de assimilar o que significam para nós as palavras “índio” e “caboclo”, há de ter frouxos de riso ouvindo alguém dizer que são eles os incendiários.

O mais grave é que, bem lá no fundo de sua consciência (é possível que ainda lhe reste alguma), nem o próprio Bolsonaro acredita na estupidez por ele dita ao mundo. Por que, então, o fez? Tenho para mim que é alguma espécie de transtorno mental que obriga a pessoa a ser, sempre e sempre, contrária ao bom senso.

De outra forma não se pode explicar a reiteração da conduta presidencial. Criando um neologismo, o presidente disse que é preciso combater a “cristofobia”, assim como se no Brasil estivesse o povo se levantando contra a pregação do Evangelho. Completa loucura. Certo que a tal “bancada evangélica” não merece o mínimo de credibilidade, mas daí até dizer que se tem medo patológico (é isso que fobia significa) do Cristo, vai uma distância intransponível. De maneira muito conveniente, todavia, o presidente esqueceu de falar sobre a violência praticada com os adeptos das religiões de origem africana.

Nem eu, com o meu ateísmo insuperável, me considero um “cristofóbico”. Longe disso. Sempre respeitei todos os pontos de vista e em todas as áreas. Mas o que não faço é alardear uma religiosidade que tende à carolice para usufruir de rendimentos políticos. Isso é imperdoável. Está na hora de alguém dizer ao presidente que tenha modos. Não está ele brincando no quintal de sua granja. Deveria mostrar mais respeito pelo povo que, em momento de loucura, o elegeu.(Félix Valois é Advogado, Professor, Escritor e Poeta – felix.valois@gmail.com)